Agora

A noite já havia assumido seu turno quando ela chegou em casa. Fazia um frio normal para aquela época do ano. Por isso decidiu olhar a caixa de correspondência e subir até o terceiro andar (em seu prédio não havia elevador).

Na ânsia por encontrar as chaves acabou derrubando os envelopes que estavam em sua mão. Como era de se esperar, ao juntá-los somente contas, contas e mais contas. Não se deteve muito naquele monte de papel espalhado por sua porta. O frio falava mais alto, primeiro entraria em casa, depois voltava para buscar os “comilões” do seu salário.

Entrou em casa, ligou a cafeteira, deu comida para seu gato, tirou as botas. E só então se lembrou dos envelopes espalhados no chão. Voltou para juntá-los, folheou-os sem muito interesse. Até que percebeu que um deles se diferenciava no tamanho, na cor e no selo. O destinatário estava à mão. Ela havia recebido uma carta de fato.

Seis meses se passaram ele decidira dar sinal de vida. Será que havia sentido o cheiro da sua felicidade? Depois de terem feito planos sobre o futuro, terem brindado o presente. Depois de todas as flores, as juras e os poemas trocados. Depois de ele ter dito que ia apenas comprar um vinho para brindarem a nova casa e nunca mais voltar. Era muita coragem mandar uma carta.

Agora que o choro havia secado, o cabelo tinha mudado de cor. Agora que ela havia conseguido um diploma, um emprego, um nome. Agora que ela era forte e destemida ele ousava testar sua capacidade.

De que adiantava perguntar da família. As pessoas que ele deixou pra trás. E saber dela? Ele queria saber dela. Pra que? Ela estava muito bem obrigada. E não fez a mínima questão de anotar o remetente. Se antes ela era boba, agora ela não é mais. Agora ela é ela acima de tudo. E rasgar o tal envelope com letras de forma era muito mais útil do que se prestar a dar resposta com quem não merece o mínimo: consideração

1 comentários:

Juliana.... disse...

Nossa, fico muito satisfeita de tu ter conseguido escrever isso! E muito mais ainda de entender.
Realmente tu tem razão, nada como rasgar alguém ou algo das nossas vidas, por mais que doa... Porém, uma vez vá lá ser enrolada. Duas? Nem pagando!

Beijos, flor. Se cuida!

P.S.: Deu até vontade de escrever um texto nesse estilo. iuahsasashuisuiahsuias