O dia em que nasceu denovo...

No dia em que nasceu de novo acordou desnorteada. Dormiu fundo. Ela havia relutado de sair depois de um longo de trabalho. Mas as quase 24 horas sem dormir trouxeram resultados maravilhosos e definitivos para sua vida.

Olhou-se no espelho e este a mandava para o chuveiro com urgência. Tinha dormido assim como chegou da rua. Caminhou lentamente até o banheiro ainda estranhando sua reação e sem saber lidar direito com a sensação de leveza.

A roupa ficou jogada pelo chão em sinal de um passado deixado para trás. Era como vestígio que não interessava mais.

O primeiro passo era remover os resquícios de maquiagem de seu olho. Cada vez que o algodão passava em sua pálpebra, ela esquecia um pouco mais dos muitos elogios feitos ao seu olhar irresistível. Como se nunca tivesse ouvido dele que seu olhar tinha o apaixonado desde o primeiro encontro

Entrou no chuveiro. A água bem quente passava por cada mínimo pedaço do seu corpo. Ainda que limpa, ela podia sentir como se aquele perfume que um dia ela tanto amou saia do corpo dela em forma de líquido sujo. O único odor que ela lembrava era o do seu próprio sabonete de rosa branca.

Deixou que a água invadisse as entranhas da sua cabeça molhando seus longos cabelos negros. Era necessário que seus cachos voltassem para o lugar, pois ela não queria mais o liso que era pedido por ele. E enquanto a forma real voltava, ela apagava da mente todos os cafunés trocados.

Desligou o chuveiro. Enrolou-se em uma toalha felpuda. Passou-se óleo de amêndoas e assim tirou qualquer vestígio de que um dia as mãos dele por ali passaram. Por fim, escovou os dentes para tirar o gosto amargo e indesejado de uma boca que jamais voltaria a encontrar a sua.

Respirou aliviada. Estava livre. Havia achado a sua cura nele. Estava ali perante ela o tempo todo. Mas não tinha vontade de ver. Até que mesmo sem querer viu. E não chorou. Foi a ausência de lágrimas que mostrou que o desrespeito dele não fazia a menor diferença, ele era indiferente para ela.

Consciência? Nunca estivera tão leve. Sempre foi correta, sempre se doou com todas as forças. Ela nasceu de novo no dia em que foi capaz de perceber que não adianta querer que as pessoas sejam especiais. Muitas vezes elas escolhem não fazer a diferença.

Sua vida não seria medíocre em função dele. Ela queria mais e sabia que era capaz de alcançar. Nasceu de novo quando percebeu que ele não era nada. E depois disso, viveu feliz pra sempre.

No primeiro dia de sua nova vida fez um café e sentou-se na frente do computador. Queria contar para o mundo que estava livre através de uma história bonita. Não conseguiu. Nem inspiração ele lhe trazia mais. Começou a rir então e decidiu começar uma história sobre a insignificância de um homem que não quis ser único e a fez nascer de novo.